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segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Estréia - ¡Salta! com inspiração no cinema argentino de Lucrecia Martel

Foto; Cacá Bernandes

A peça incorpora ao teatro a poética presente nas obras da cineasta com uma história com múltiplas relações e aberta a interpretações. O Pântano (2000), A Menina Santa (2004) e A Mulher Sem Cabeça (2007) - filmes da cineasta argentina Lucrecia Martel - servem de propulsores para a encenação. Os longas lidam com relações familiares, uma característica presente na peça, além da audiocenografia que cria um ambiente único.

A partir dos anos 90, o cinema argentino passou por uma renovação, onde surgiram nomes renomados da sétima arte portenha; entre eles se destaca a radicalidade de Lucrecia Martel. Imerso nessa atmosfera, ¡Salta! estreia em 18 de janeiro, sexta-feira, às 20h no Espaço das Artes do SESC Santo Amaro. Esse é mais um trabalho do Coletivo TeatroDodecafônico, a direção é de Verônica Veloso, a dramaturgia é de Veronica Stigger, e o elenco conta com os atoresBeatriz Cruz, Gabriela Cordaro, Joaquim Lino, Katia Lazarini e Miriam Rinaldi.

Na trama, três mulheres se relacionam e se mesclam, definindo-se ora como irmãs, ora como amigas, mães e filhas. A presença de uma jovem e de um homem ajuda a delinear traços de uma familiaridade confusa. A tensão do ambiente anuncia algo que aconteceu ou está por acontecer. Neste clima, um assunto proibido permeia os diálogos e a vida destas pessoas. A dramaturgia, assinada pela escritora Verônica Stigger, é fragmentada e foi construída a partir das cenas criadas pelo Coletivo.

O Pântano (2000), A Menina Santa (2004) e A Mulher Sem Cabeça (2007) - filmes da cineastargentina Lucrecia Martel - servem de propulsores para a encenação. Os longas tratam de relações familiares, característica presente na peça. “Muito mais do que adaptar os filmes, procuramos criar uma montagem com as reações que eles nos trazem. Buscamos incorporar ao teatro a poética presente nas obras da cineasta com uma história com múltiplas relações e aberta a interpretações”, conta Verônica Veloso.

Parte das ações principais ocorre em momentos de ócio da família e fora do alcance do olhar da plateia, assim como nos enquadramentos da diretora argentina. “Uma situação que gera a iminência de algo que está prestes a acontecer”, pontua Verônica Veloso. O treinamento corporal dos atores também está a serviço dessa atmosfera: “Os corpos são exibidos em disposições espaciais que remetem às esferas de intimidade, são mais valorizados a coluna vertebral, personagens de costas ou apenas extremidades como braços e pés.”
A trilha sonora, uma das questões primordiais da encenação, é colocada em cena como uma audiocenografia. ¡Salta! teminserções sonoras de fontes diversas: ruídos de um mar ausente, umpiscina presente apenas sonoramente, músicaslatinas, programa de TV, barulho duma TV ligada em outro cômodo, chuveiro, entre outros. O objetivo é revelar um leque de vários caminhos para o espectador, com ruídos produzidos fora da cena ou que não fazem parte do universo ficcional.

“A audiocenografia de Felipe Julián tem como resultado um espaço, um ambiente, uma atmosfera criados pelo que as pessoas ouvem. O som infiltra, invadeocupa, uma forma de extensão da peça”, destaca a diretora. Logo no foyer do teatro, uma instalação com 100 alto-falantes e objetos utilizados em cena estarão expostas para colocar o público em contato com a obra e mergulhar no universo de ¡Salta!.

A peça se passa no ambiente quente e úmido de uma casa com piscina em algum lugar da América Latina. Daí o título da peça que faz referência à ideia de suspensão presente no movimento de saltar e aos saltos temporais presentes na dramaturgia fragmentada da encenação.

Esta é a primeira vez que o Coletivo Teatro Dodecafônico se apresenta num espaço no qual o espectador observará a peça de maneira frontal, quase numa relação de palco italiano. Acostumado com sessões em espaços alternativos e intervenções urbanas, o Coletivo usa toda seu repertório para envolver o Espaço das Artes do Sesc Santo Amaro. “Sem o diferencial do espaço, que sempre nos acompanhou, o som ocupa esse lugar de destaque, criando atmosferas e envolvendo o público com sonoridades que vêm de diferentes caixas de som, posicionadas ao seu redor”, comenta Verônica Veloso. A diretoracita uma frase de Bob Wilson que sintetiza bem a montagem. “É como se fosse uma peça radiofônica aliada a um filme mudo”, finaliza.
O processo de criação de ¡Salta! faz parte do projeto contemplado pela 19ª Edição do Programa Municipal de Fomento ao Teatro - Secretaria da Cultura. A estreia e temporada são uma realização do SESC em parceria com o Coletivo Teatro Dodecafônico.

Sobre Lucrecia Martel

A obra de Lucrecia Martel é reconhecida mundialmente pela forma como apresenta a realidade latino-americana e a transforma em proposta estética e pela maneira como utiliza de forma peculiar e inovadora a faixa de som e os enquadramentos. Seus três longa-metragens foram vencedores de vários prêmios, entre eles o Urso de Ouro de Berlim, além de terem concorrido por duas vezes à Palma de Ouro do Festival de Cinema de Cannes. Seu terceiro filme foi produzido pelos irmãos Almodóvar, parceria que segue até hoje na criação de seu novo trabalho.

Contemporânea dos cineastas do Nuevo Cine Argentino, a diretora preserva um estilo próprio, mantendo-se fiel a questões consolidadas pela constante reiteração de temas e motivos como a presença de uma dança das gerações entre e mães e filhas, certo deslizamento entre um estado de languidez juvenil e de apatia, além da insistência no uso da piscina, nas figuras da precipitação e da morte. Em diálogo com a cineasta, o Coletivo tem buscado transpor os procedimentos do cinema de Martel para a encenação ¡Salta!.

Sobre o grupo

Coletivo Teatro Dodecafônico é um conjunto de artistas reunidos em torno da pesquisa de procedimentos para a composição da cena teatralcontemporânea, na qual todos os elementos da linguagem cênica (texto, espaço, corpo, tempo e som) têm igual relevância. Têespecialinteresse para o Coletivo propor interações entre procedimentos do cinema e do teatro para a criação cênica, assim como a relação entre corpo earquitetura na encenação.

As cenas são criadas como se o público fosse uma câmera que observa oatores. O corpo é trabalhado a partir doprincípiotécnicosdesenvolvidopoKlauss Vianna Os atoreassume figuras;  raramente sã visto compersonagens. Afiguras são compostapor meio dacomposição corporal, físico-vocal.

Toda composição do Dodecafônico é uma reação a uma obra de referência: um texto literário, um filme ou umimagem pictórica. A partir dessaescolha, o Coletivo procura reagir à obra, e não adaptá-la para o contexto teatral. Reagir é transpor (no caso da literatura, sem transformar discursoindireto em direto); reagir é transformar (a obra original compropulsora de novas formas textuais e imaticas) e reagi é montar, como nalinguagem cinematográfica (sobrepoelementos, criar em camadas).

A pesquisa do Coletivo Teatro Dodecafônico começou em 2007, com a criação de ISAURA S/A + 1 Experimento Hidráulico, parte prática dapesquisa de mestrado de Venica Veloso, que buscava na poética cinematográfica inspiraçãpara a criação cênica A segunda montagem doColetivo, O Disfarce do Ovo  uma reação à Clarice Lispector, questreou em 2009, reagiu aos contos “Legião Estrangeira e O Ovo e aGalinha. Na terceira encenação, O QUE ALI SVIU, que estreou em 2010, o Coletivo se propõe a reagir às Alices de Lewis Carroll  Alice noPaís das Maravilhas” Alice Através do Espelho , como ponto de partida para uma reflexão sobre a infância. Em setembro de 2011, o Coletivo foicontemplado pela Lei de Fomento ao Teatro do Munipio de São Paulo, com o Projeto Decupagem Dodecafônic(execução de outubro de2011 a outubro de 2012). Nele, o Coletivo compartilha seu processo de criação em duas vertentes: 1) São Paulo Através do Espelho, ondeo foco se volta para a cidade de São Paulo; 2)

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