Fotos João Caldas |
Um Porto para Elizabeth Bishop volta 10 anos depois, no centenário da escritora americana
A peça - que teve repercussão internacional quando estreou em 2001, sendo página da revista Newsweek e matéria de capa do New York Times - conta a história da escritora americana, ganhadora do Prêmio Pulitzer, e sua relação com o Brasil, onde viveu por 15 anos, ao lado da companheira Lota Macedo Soares. Além do Prêmio APCA, o espetáculo recebeu os prêmios Cidadania e Diversidade, da Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo, e Arco Íris
Escrita por Marta Góes especialmente para sua amiga Regina Braga interpretar, sob a direção de José Possi Neto, a peça Um Porto para Elizabeth Bishop entra em cartaz em São Paulo a partir de 13 de maio no Teatro Eva Herz, no Conjunto Nacional. A reestreia realiza o desejo da atriz Regina Braga de ter o seu “Quadrante”, como ela diz, lembrando do monólogo que Paulo Autran apresentou por muitos anos, nos intervalos entre outros espetáculos. “Continuo encantada pelo tema”, diz Regina.
Ao estrear em 2001, Um Porto para Elizabeth Bishop teve repercussão incomum: foi tema - não apenas em seções de teatro e de artes - mas também de grandes colunistas como Arnaldo Jabor, Zuenir Ventura, Humberto Werneck, Eugenio Bucci, Marcelo Rubens Paiva, Ignácio de Loyola Brandão, Roberto Pompeu de Toledo e Daniel Piza, entre outros Mereceu, ainda, uma página da revista Newsweek e matéria de capa do caderno Arts and Leisure do New York Times. Sob a foto de Regina Braga, o título da reportagem, assinada por Larry Rother, dizia: Finalmente os brasileiros descobrem Bishop”.
O centenário de nascimento de uma das mais importantes poetas americanas do século 20, que começou a ser celebrado dia 8 de fevereiro de 2011, com uma vasta programação, sobretudo nos Estados Unidos e no Canadá, colocou sua vida e sua obra ainda mais sob os holofotes.
A decisão para reestreiar Um Porto para Elizabeth Bishop surgiu numa conversa com Pedro Herz, dono da Livraria Cultura que abriga o teatro Eva Herz. Regina já pensava em voltar a interpretar a personagem, quando Pedro sugeriu que o fizesse naquela sala. Na ocasião, ela se preparava para gravar o personagem Cecília, na novela Tititi, de Maria Adelaide Amaral, e programou estrear a peça logo em seguida: “Sempre soube que voltaria a fazer Bishop”.
Na década que separa o lançamento (em 2001) da reestreia, cresceu aqui no Brasil o prestígio da autora, que foi casada com a brasileira Lota Macedo Soares, urbanista autodidata responsável pela obra do Parque do Flamengo, no Rio de Janeiro. Intelectual, Lota era amiga da elite e de políticos - foi coordenadora geral de obras na gestão do governador Carlos Lacerda.
A peça de Marta Góes recebeu montagens internacionais. A primeira encenação fora do Brasil de Um Porto Para Elizabeth Bishop foi a de Vassar, no New York Stage and Film Festival, em 2004; depois foi encenada em Nova York, no 59E59, em 2006. Em 2009 foi feita uma leitura em Vassar durante uma homenagem a Frances Sternhagen (atriz de E.R., Sex & The City e The Closer), e em junho de 2010 houve outra leitura no South Bank Centre Festival, em Londres, por Amanda Drew, atriz da série Eastenders.
A poeta no Brasil
A peça retrata a vida da ganhadora do prêmio Pulitzer (de Poesia de 1956), que viveu no Brasil por quase 15 anos (nas décadas de 50 e 60), mantendo casas em Ouro Preto e Petrópolis, cidades onde passou os anos mais felizes de sua vida. “O que aparece na peça são os anos de sua convivência com Lota Macedo Soares, o grande amor de sua vida e sua relação afetiva mais duradoura. Foi por causa de Lota que ela ficou no Brasil, e foram esses anos de aconchego e felicidade que alimentaram a parte mais importante de sua obra”, explica Marta Góes.
A aventura pessoal da poeta no Brasil começou em dezembro de 1951, quando, aos 40 anos, desembarcou de um cargueiro no porto de Santos para uma breve escala turística que se estendeu por anos. Estava profundamente deprimida e abusava do álcool.O encontro entre a escritora e o país exuberante e inquieto dos anos 50 e 60 inspirou poemas, um livro-reportagem (Brazil, publicado pela Life) e as cartas reunidas em “Uma Arte”, sua correspondência completa. Elizabeth Bishop viveu no Brasil até 1966, mas ainda voltou por muitos anos à casa de Ouro Preto. Ela teve seu nome incluído nas revisões mais importantes da produção literária dos últimos 100 anos.
Na peça Regina faz Bishop dos 40 aos 69 anos. “Há 10 anos sei que tinha um olhar mais jovem para a personagem, uma visão mais próxima dos 40 anos. Ter a oportunidade de fazê-la uma década mais tarde me instiga a buscar uma interpretação mais madura”. . Mônica Sucupira, assistente de direção, faz outra observação sobre este tempo: “A Regina é uma atriz muito inquieta, ela nunca fica para trás, quando estreamos Bishop ela já estava 10 anos a frente no tempo e no pensamento, e assim continua”.
Por esse trabalho Regina recebeu o Prêmio APCA de melhor atriz, e os prêmios de Cidadania da Associação carioca Arco Íris e da Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo.
Para Marta Góes a personagem é fascinante porque, “além de ser uma grande poeta, cada vez mais reverenciada, Elizabeth Bishop tem uma história de resistência à adversidade, além de ter sido testemunha de momentos dramáticos da história brasileira. Chegou às vésperas dos Anos Dourados, em 1951, e foi embora em plena ditadura, no começo dos anos 70. Venceu a solidão, a depressão, enfrentou a clandestinidade por ser homossexual na atmosfera repressiva dos Estados Unidos de sua juventude e os conflitos inevitáveis da criação artística. “Ela sofreu, mas continuou a produzir, e sua importância hoje lhe faz justiça”.
O diretor José Possi Neto assinala: “Bishop permite falar sobre nosso país na perspectiva de um olhar de fora, estrangeiro e, especialmente, aguçado e sensível. Ela vivenciou momentos decisivos da nossa história, com o distanciamento de uma visitante”.
A peça apresenta visões contraditórias sobre o Brasil: de um lado, o deslumbramento com a natureza da Serra Fluminense, com a candura do povo, com seu potencial amoroso; de outro, a irritação com nossos atrasos e primitivismos. O texto ressalta as opiniões de Lota, representante da elite carioca naqueles anos pré-golpe militar, mulher culta e empreendedora que construiu o Parque do Flamengo, no Rio.
Contar a vida de Elizabeth Bishop traz à tona personagens de nossa história recente: Carlos Lacerda, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Mello Neto e, sobretudo, Lota Macedo Soares, a razão pela qual Elizabeth que pretendia apenas fazer uma pequena escala no Rio, durante uma viagem em torno do continente, acabou permanecendo aqui por tanto tempo.
Marta Góes ouviu falar muito cedo de Elizabeth Bishop. “Passei a infância em Corrêas, que fica ao lado de Samambaia, onde Elizabeth morava. Uma grande amiga de Lota, sua ex-companheira, Mary Morse, tinha as filhas (Mônica e Marta) no colégio de minha mãe. Mary ia buscar as meninas, todas as tardes. Lota era muito escandalosa, falava palavrões na oficina onde levava seus carros-esporte e encomendava camisas monogramadas no alfaiate mais chique de Petrópolis, o De Carolis”.
No camarim de Regina
Além de fragmentos da obra integrarem a dramaturgia, dados biográficos e personagens cruciais na vida da poeta estão no palco. Algumas dessas pessoas assistiram à montagem. Regina conta que se surpreendia com a quantidade de gente que havia conhecido pessoalmente Lota ou Bishop, e que vinha falar com ela no final das apresentações.
Na estreia da peça, recebeu um buquê de copos-de-leite. O cartão dizia: “Essas flores vieram do jardim de Bishop”. Dessa forma, Regina recebeu os votos de sucesso para a temporada, de dois grandes amigos da poeta, os irmãos Linda e José Alberto Nemer, pessoas muito próximas de Elizabeth nas últimas temporadas que ela passou na casa de Ouro Preto.
Depois da morte dela, eles compraram a casa e cultivam o jardim até hoje, do jeito que ela gostava. Quando apresentou a peça em Ouro Preto, a atriz se hospedou nessa casa do século 17, a convite dos irmãos Nemer. Durante a estadia, dormiu na cama de Elizabeth, e ganhou uma folha de cheque assinada por ela. A filha de Carlos Lacerda, amigo íntimo de Lota e Bishpo, e Mônica, filha de Mary Morse, que a poeta viu crescer, emocionadas, também estiveram no camarim.
Na peça, Marta Goes não se detém sobre a homossexualidade de Elizabeth Bishop: “Trato-a como protagonista de uma história de amor: paixão, afeto, conflito, separação”.
Sobre Regina Braga
Regina Braga foi aluna da Escola de Arte Dramática de São Paulo, e completou sua formação estudando teatro durante três anos, em Paris. Quando voltou ao Brasil em 1970, ganhou o prêmio de revelação de atriz pelas personagens que interpretou naquele ano. Casou com o diretor Celso Nunes, com quem fez várias peças: Entre elas "O Interrogatório", em 1970; "E Se A Gente Ganhar a Guerra", em 1971 e "Equus", em 1975. Com ele teve dois filhos: Gabriel, que é também ator e Nina, que é fisioterapeuta.
No teatro, entre outros trabalhos, atuou em “Chiquinha Gonzaga” (1983), Uma Relação Tão Delicada” (1989), “Cenas de um Casamento”(1994) e “A Margem da Vida”’, (1996). Os dois primeiros lhe renderam o prêmio Moliere, de melhor atriz do ano. Em 1980, trabalhou em “Meu Pé de Laranja Lima”, na TV Bandeirantes. Desde então, participou de diversas novelas, entre as quais “Deus Nos Acuda'; "Por amor" e "Mulheres Apaixonadas", “Tititi” e nos seriados "JK", da TV Globo, e “Alice”, da HBO. Depois de se divorciar de Celso Nunes, casou com o médico e escritor Drauzio Varella, com quem tem duas filhas enteadas, Mariana, editora, e Letícia, médica.
Sobre Marta Góes
Marta Góes é jornalista e escritora. Antes de começar a escrever livros e peças de teatro, trabalhou em jornais (Ultima Hora SP, O Estado de S. Paulo e Jornal da Tarde) e revistas (Isto É, Veja, Afinal e CLAUDIA). É autora de sete peças teatrais e suas personagens já foram interpretadas por atrizes como Regina Braga, Irene Ravache, Amy Irvin e Marisa Orth. Em 2003, escreveu o livro infantil A menina que se apaixonava, sobre sua infância em Petrópolis. Em 2007, lançou a biografia Alfredo Mesquita, Um grã-fino da contramão, sobre o criador da escola de Arte Dramática de São Paulo e, em 2008, Mulheres virando o jogo, uma coletânea de textos teatrais. Nos últimos meses, dirigiu a revista Private Brokers. Atualmente, participa da equipe de uma novela que deve estrear em setembro, na Globo.
A estreia como dramaturga aconteceu no palco do Espaço Off, nos anos 80, com a comédia Prepare seus pés para o verão. Desde então, mantém o fascínio pela comédia do cotidiano. Escreveu também A moça que falou assim, a inédita Miss Cýclone, Um porto para Elizabeth Bishop. Em A reserva, Marta volta ao universo das pessoas comuns. Não mais para buscar-lhes a caricatura, mas para apontar as grandes escolhas embutidas nas situações prosaicas. Por alguma razão, todas as suas protagonistas, até agora, são mulheres.
Sobre Elizabeth Bishop
Nasceu em Worcester, Massachussets (EUA). Perdeu o pai morreu com 8 meses. A mãe foi internada em clínica para doentes mentais quando ela tinha 5 anos. Foi criada pelos avós maternos durante 2 anos em Great Village, na Nova Escócia, Canadá, quando sua guarda foi reivindica pelos avós paternos. Viveu, então, com a familia do pai, que a tratava sem afeto. Foi aluna de vários colégios internos, até ingressar na faculdade Vassar, para estudar Letras. Padeceu de asma e alergias, de depressão e de alcoolismo. Formou-se em 1934, e viajou pelo mundo com a herança deixada pelo pai. Seu primeiro livro, North and South, foi publicado em 1946. Morou no Brasil de 1951 a 1967. Era cultuada aqui por amigos e por um pequeno círculo literário.
Ao morrer, em 1978, vítima de um aneurisma, já havia se tornado uma escritora conhecida. Recebera o prêmio o Pulitzer, o National Book Award, o National Book Critics Circle Award e o Prêmio Internacional Neustadte Literatura, que até 1976 jamais fora conferido a uma mulher. Seu poema “Uma Arte” foi lido por Cameron Diaz no filme “Em seu Lugar”. Algumas de suas obras editadas: Prose, edição de Lloyd Schwartz, Poems , edição de Saskia Hamilton, Elizabeth Bishop and The New Yorker, the Complete Correspondence, de Joelle Biele, Poems, Prose & Letters, edição de Llooyd Schwartz. No Brasil, Uma Arte – Cartas de Elizabeth Bishop, Esforços do afeto, Poemas do Brasil e O iceberg Imaginário e Outros Poemas, todos com tradução de Paulo Henriques Britto e editados pela Cia das Letras.
SERVIÇO:
prorroga temporada até 4 de agosto
UM PORTO PARA ELIZABETH BISHOP – Estreia dia 13 de maio, às 21 horas, no Teatro Eva Herz da Livraria Cultura - Conjunto Nacional - Avenida Paulista, 2073, Metrô Consolação. Temporada: sextas e sábados às 21h e domingos às 19h. Até 26 de junho. Bilheteria: (11) 3170-4059. De segunda a sábado, das 14 às 21 horas e aos domingos e feriados, das 12 às 20 horas. Ingressos à venda pela Internet: www.teatroevaherz.com.br ou www.ingresso.com.br. Vendas/Call-center: 4003-2330. Ingressos - R$ 40,00 (sexta) e R$ 50,00 (sábado e domingo). Compras pelo sistema da ingresso.com, funciona da seguinte maneira: Call-center: (adicional de 20%) Inteira: R$ 60,00 - Meia: R$ 30,00. Internet: (adicional de 15%) Inteira: R$ 57,50 - Meia: R$ 28,75. Os ingressos são retirados na bilheteria do próprio teatro. Formas de pagamento: dinheiro e todos os cartões de débito e crédito – não aceitam cheque.Classificação etária: a partir de 14 anos. Duração: 70min. Capacidade do teatro: 166 lugares.
Ficha técnica - De Marta Goes.
Direção de José Possi Neto.
Assistente de Direção: Mônica Sucupira. Com Regina Braga.
Cenógrafo: Jean Pierre Tortil.
Iluminador: Wagner Freire.
Trilha Sonora: George Freire. Figurinista: Lu Pimenta. Visagismo: Fabio Namatame.
Direção de Produção: Brancalyone Produções Artísticas (Edinho Rodrigues e Elza Costa).
Realização: Ágora Produções Teatrais e Artísticas. Assessoria de Imprensa – Arteplural Comunicação.
Faltou a Roberta Serretiello, na operação oficial da trilha desta peça maravilhosa.
ResponderExcluirABs
Mario
Estou com mta vontade de ver, mas ainda nao vi...
ResponderExcluirMario qdo ao nome de Roberta, nao recebi esta na integra ao release... valeu a dica! passe sempre por aqui. bjs
sou escritor, pesquisador de Bishop, gostaria apresentar um ´´Café Cultural´´, bate-papo com a atriz Regina Braga em Santos, cidade mítica para Elizabeth....
ResponderExcluirabraços
flavioamoreira@uol.com.br